domingo, 20 de maio de 2018

Bolsonaro como imagem invertida de Lula

Por Almir M. Quites



Nota inicial:
Primeiramente esclareço que não acredito no processo eleitoral brasileiro e, por coerência, não participo dele. Sempre vou à cabine eleitoral e lá faço o Protesto do Joãozinho.


Recebi muitas críticas e contestações quando defendi a Procuradoria Geral da República (PGR) no episódio do dia 13 do mês passado, no qual Jair Bolsonaro foi denunciado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela pela prática de racismo contra quilombolas, indígenas, refugiados, mulheres e LGBTs (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros). 

A insistência dos leitores em restringir a questão a um problema meramente de disputa eleitoral é tanta, que esta é a segunda vez que utilizo meu blog para explicar o meu entendimento sobre o caso. Neste artigo de hoje, repito os argumentos já apresentados, com uma redação mais clara, e acrescento uma comparação comportamental entre Bolsonaro e Lula.
Começo pela denúncia da PGR ao STF e depois mostrarei o quanto são semelhantes os comportamentos de Lula e Bolsonaro. Um é a imagem invertida do outro num espelho. O que é esquerda vira direita e vice-versa.

A denúncia deste abril se refere a um episódio ocorrido em abril do ano passado (2017), durante discurso do deputado no Clube Hebraica do Rio de Janeiro.

A acusação elencou frases que teriam sido ditas por Bolsonaro, como estas três, tomadas como exemplo:

  • "Eu tenho 5 filhos. Foram 4 homens, a quinta eu dei uma fraquejada e veio uma mulher"
  • "Alguém já viu um japonês pedindo esmola por aí? Porque é uma raça que tem vergonha na cara. Não é igual essa raça que tá aí embaixo ou como uma minoria tá ruminando aqui do lado"
  • "Isso aqui é só reserva indígena, tá faltando quilombolas, que é outra brincadeira. Eu fui em um quilombola em El Dourado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador eles servem mais. Mais de um bilhão de reais por ano gastado com eles".
Evidentemente que não me cabe verificar a veracidade destes fatos, mas parece-me extremamente improvável que a Procuradoria Geral da República não tenha provas. Afinal, foram declarações num ato público.

Qualquer brasileiro tem liberdade para se expressar, mas não pode infringir a Lei da Injúria Qualificada, prevista no artigo 140, § 3º do Código Penal. Deve-se não confundir liberdade de expressão com agressão verbal criminosa,  prevista em Lei. A lei referida trata de ofensas a honra de alguém com a utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem.

A Procuradora não tomou iniciativa alguma para prejudicar a candidatura do Bolsonaro, porque a ação penal aplicável a esse crime é pública, não é de iniciativa da Procuradoria Geral da República. Quem apresenta a ação é o ofendido. Uma vez aberta a ação judicial, então, cabe ao Ministério Público assumir o caso. Logo, a procuradora Raquel Dodge tinha obrigação de assumir caso. 

Quem prejudicou a candidatura de Bolsonaro à presidência, não foi a procuradora Raquel Dodge, foi o próprio candidato. Nenhum brasileiro, nem mesmo um deputado federal, está acima da Lei.

A Procuradoria Geral da República entendeu que a acusação era procedente, ou seja, que, de fato, Jair Bolsonaro praticou, induziu e incitou discriminação e preconceito contra comunidades quilombolas, inclusive comparando-os com animais e que, durante o evento, o deputado também incitou a discriminação com relação aos estrangeiros, estimulou comportamentos xenofóbicos e discriminação contra imigrantes — o que é vedado pela Constituição e pela lei penal. A denúncia reúne ainda outros discursos de Jair Bolsonaro contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros.

Bolsonaro é intempestivo mesmo, destemperado e irresponsável. Ele mesmo se complicou, deu um tiro no próprio pé. 

Não é a primeira vez que Bolsonaro faz isso. Um dia algum ofendido abriria um processo contra ele. Desta vez aconteceu. Repito: a culpa do que ocorreu é do próprio Bolsonaro.

Há muito tempo Bolsonaro vem frequentemente mostrando publicamente seus preconceitos e, deste modo, infringindo a Lei.

As frases que foram publicadas são tipicamente manifestações preconceituosas que caracterizam a infringência da Lei. As ofensas foram contundentes.

Com relação à candidatura, mantenho minha posição. Parece-me óbvio que Bolsonaro não tem estatura moral para ser Presidente da República, como Lula e Dilma não tinham. 

Quando escrevi que o comportamento vulgar, bravateiro e irresponsável, de Bolsonaro não diferia muito do comportamento do Lula, a reação foi imediata. Bolsonaristas ficaram indignados.

Para seus adeptos, o deputado Jair Messias Bolsonaro seria o avesso do ex-presidente Lula da Silva. Um estaria no espectro ideológico da direita e outro no da esquerda. Esquerda e direita são espectros simplistas e simétricos da política. Há muito em comum entre ambos, tanto que, nos regimes mais radicais, é bem fácil perceber que eles não se distinguem. Uma ditadura de esquerda não é diferente de uma ditadura de direita, não importa se a ideologia seja nacionalista ou internacionalista. 

Politicamente Luis Inácio Lula está "mortinho da Silva", trancafiado num presídio, condenado a 9,5 anos. Bolsonaro quer substituí-lo no imaginário popular. Logo, convém examinar mais detidamente a similitudes entre ambos. 

Há muito mais em comum entre Lula e Bolsonaro do que suspeitaria a imaginação popular brasileira. Ao seu modo, ambos adotam um discurso populista. O populismo é a atitude política que exalta o povo como uma entidade de qualidades superiores, quase divinas, mas que na verdade é tratado como um ser infantilizado, adulado com princípios e programas demagógicos, isto é, baseados na estratégia de agradar a massa popular a qualquer custo para poder manipulá-la, incluindo promessas que não serão realizadas, visando apenas a conquista do poder político e ou outras vantagens inconfessáveis. É a estratégia de condução político-ideológica, valendo-se da utilização de argumentos emocionais, concupiscentes, estimuladores de cobiça, ou irracionais, sempre em proveito próprio. 

Bolsonaro e Lula 
apresentam-se com a roupagem de Salvador da Pátria. Se Lula fosse um simples eleitor votaria em Bolsonaro; se Bolsonaro fosse um simples eleitor, votaria em Lula. 

No comportamento, um é o espelho do outro. Ambos são grosseiros, incultos, vaidosos, irresponsáveis, bravateiros, mentirosos... Se fossem irmãos não teriam comportamentos tão semelhantes. No meu modo de ver, há uma sutil diferença entre eles. É que Lula é dissimulado, enquanto Bolsonaro não consegue sê-lo por absoluta falta de empatia.

Os petistas e os bolsonaristas também são muito semelhantes. 

Ambos tratam de despertar um saudosismo enganoso, que desconsidera a impossibilidade de se voltar ao passado político e econômico. Hoje o Brasil, trôpego, mal caminha e o mundo também mudou. Mesmo assim, ambos pregam uma volta a um passado. Lula se dedica à canonização do seu governo, para vender a imagem de um período de prosperidade em comparação ao que temos hoje. Bolsonaro se 
dedica à canonização da Ditadura Militar, para trazer à tona os resquícios da poderosa propaganda da era do “milagre econômico” e assim contrapor a realidade de hoje à época em que se alardeava haver emprego, crescimento e segurança. Ambos esquecem que uma crise política e econômica como a de hoje não acontece da noite para o dia e por acaso. Bem ao contrário, a crise brasileira foi construída durante muitas décadas de demagogia e muito trabalho contra os interesses da nação. Bolsonaro e Lula exageram desmedidamente as virtudes desses dois períodos históricos e escondem a herança maldita que deixaram para os governos posteriores.

Os dois milagres econômicos do passado, o de Bolsonaro e o de Lula, eram falsos. 

O “milagre econômico” do regime militar só sustentou certa estabilidade em uma conjuntura internacional na qual o petróleo tinha preços baixíssimos (à época o Brasil não era autossuficiente) e a economia tinha elevado grau de liquidez internacional. A crise do petróleo de 1973 levou ao fim do “milagre” e levou o governo do general Ernesto Geisel a um falso crescimento devido intervencionismo estatal demagógico na economia.

Em 1979 veio a nova crise do petróleo e o Brasil entrou em colapso, com uma dívida externa não administrável e uma inflação de 242,68% no último ano do governo do general João Batista Figueiredo. O “milagre econômico” desaguou no pesadelo da década perdida dos anos 80. É para esse mundo que Bolsonaro quer nos trazer de volta.

O “milagre econômico” do governo Lula também só se sustentou em uma conjuntura internacional de petróleo a preços baixos  e de elevado grau de liquidez internacional, alavancada pelo "boom" internacional das "commodities",  que levou todos os países da América Latina a uma prosperidade passageira, porque permaneceram demagógicos ao invés de aproveitar a oportunidade para desenvolver programas sérios de desenvolvimento a longo prazo. 

Com a crise internacional de 2008, quando as Bolsas de Valores de todo o mundo despencaram, a bolha da commodities estourou, o desastre da demagógica “nova matriz econômica”, iniciada no segundo mandato de Lula, gerou a maior crise econômica da história do Brasil. Ao final do governo de Dilma Rousseff, a dívida interna bruta saltou para quase 70% do PIB, a economia recuou 8,2%, a inflação chegou a casa de dois dígitos, voltando a atormentar as famílias. Os juros, por sua vez, dispararam. O modelo de Lula & Dilma revelou-se um aparato de implodir empregos, gerando quatorze milhões de desempregados.

Lula e Bolsonaro sempre apostaram no intervencionismo estatal, no expansionismo fiscal, em políticas econômicas heterodoxas, enfim, em modelos populistas, sempre aderentes à defesa de privilégios de corporações de servidores públicos.

Tanto Bolsonaro como Lula nunca falam de economia, no entanto ambos foram contra o Plano Real e também a favor da manutenção do monopólio estatal do petróleo, contra as privatizações das empresas de telecomunicações, contra medidas de ajustes das contas públicas, que cortassem privilégios de servidores, contra a reforma da previdência desde o tempo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Bolsonaristas e petistas sempre andaram juntos. Em 1999, Bolsonaro disse em entrevista que era fã de Hugo Chávez, então presidente da Venezuela, admirador do Bolivarismo e que gostaria de ver aquele modelo aplicado a toda a América Latina (
entrevista para jornal O ESTADO). Disse também, na mesma entrevista, que ele não era contra o comunismo!

Um artigo meu, do ano passado, demonstra claramente o caráter de Bolsonaro. O título foi BOLSONARO VERSUS MÍRIAM LEITÃO - https://bit.ly/2IAysfR



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Almir Quites
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Um comentário:

  1. Muito bom seu artigo Almir.

    O velho e controverso, porém inteligente e bom frasista Winston Churchill, certa vez, referindo-se às diferenças entre Stalin e Hitler, que a extrema esquerda e a extrema direita eram como pólo sul e pólo norte. Embora em extremos opostos, suas características são quase idênticas. Populismo e demagogia ambas tem de sobra.

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